Dando sequência ao ciclo de entrevistas do Maconha da Lata, hoje batemos um papo com a nova colunista do ML, escritora e ativista pró- Cannabis, Alicia Castilla. A argentina passou 95 dias detida
por produzir matéria-prima para fabricar substância ilícita, causando uma
verdadeira comoção entre os uruguaios. Boa leitura!
Em sua opinião, porque
atualmente a Cannabis continua sendo uma planta proibida e demonizada?
Acho que está ficando menos proibida e menos demonizada. O
fato do STF ter permitido a Marcha, a quantidade de convocatórias que há este
ano, são sinais de que estamos caminhando em direção a descriminalização. A
atitude do FHC ajudou muito.
Para você, quais os principais
motivos para a legalização da maconha?
Acho que deveria descriminalizar e normatizar, mas não
legalizar porque a legalização poderia provocar uma escalada consumista e o
baseado poderia ser vendido a preços inacessíveis.
O que passou pela tua cabeça no
momento em que te prenderam unicamente por cultivar uma planta para teu próprio
consumo?
Muita coisa; na realidade nem sequer seriam para consumo. Eu
vinha publicando anualmente o Almanaque Biodinamico sem publicidade. Durante o
ano de 2010 alguns bancos de sementes se interessaram na possibilidade de
anunciar no almanaque. Sabendo que a luz e o clima do Uruguai são bem
diferentes dos da Holanda onde as sementes tinham sido produzidas decidi
testá-las. Por motivos de ordem domestica só consegui pôr-las a germinar no fim
de dezembro. Quando a policia veio me visitar no fim de janeiro as plantas
tinham menos de 40 dias. Nem sequer tinham sexado; pensei que mostrando a juíza
meus livros, o almanaque, minha trajetória poderiam me processar, mas eu
aguardaria o processo em liberdade.
Quando soube que seria transferida a um dos piores cárceres
do planeta e durante a viagem até o presídio tive algo assim como um “flash”.
Achei que estava pirando já que tive algo assim como “visões” de gente na rua. Duas
semanas depois, ainda na prisão de Canelones vi pela TV as manifestações frente
a STF do Uruguai, as pessoas fumando e pedindo minha liberação e as
manifestações na Argentina e compreendi que era isso o que tinha visto.
Qual a principal motivação, quando
escreve livros como a Cultura Cannabis? Aproveitando a deixa, existe algum
outro projeto deste tipo no momento?
A motivação foi escrever um livro que preenchesse o vazio. A
ideia me ocorreu a meados de 1997 devido ao fato de eu levar, na época quase trinta
anos fumando e não encontrar informação idônea respeito da Cannabis. Sempre que
procurava encontrava as velhas falácias: ”a porta de entrada...”, “a destruição
dos neurônios”.
No pessoal nunca senti que a maconha me levasse a procurar
outras substancias e enquanto aos neurônios...rsrsrsrsrsr
Também me preocupava o fato de constatar o terrível dano que
causa a falta de informação. Um exemplo: trata-se de um caso que aconteceu em
Salvador embora existam muitos outros semelhantes: uma família de classe media,
pai e mãe profissionais liberais descobrem na época das provas de fim do ano um
baseado escondido no tênis da filha adolescente. Conseqüência: trancaram a
filha durante todas as férias em casa sem poder falar com os amigos, nem ter
nenhum tipo de vida social. Isto aconteceu em 1996 quando os adolescentes não
tinham acesso a internet e não existiam as redes sociais. Fiquei consternada
com o caso já que não cabiam dúvidas de que o efeito do castigo era muitíssimo
mais devastador para a moça do que qualquer droga. Tudo isto foi me levando à ideia
de que a sociedade precisava de informação livre de preconceitos, de apologias
e de subjetividades. Assim nasceu Cultura Cannabis.
Na atualidade, o projeto é de converter meus trabalhos,
livros e almanaque em e-books e vende-los via web
Às vezes, quando falamos em
Maconha Medicinal, muitas pessoas pensam apenas no ato de fumar. Existe alguma
melhor forma de mostrar os valores medicinais da Cannabis- principalmente aos
leigos- sem ser necessariamente a forma fumada, que atualmente é tão demonizada
em vários países?
A melhor forma de mostrar as propriedades medicinais ou de
aproveitá-las e sem duvida o vaporizador. Existem outras, mas não em nosso
querido Terceiro Mundo e sim no Primeiro, como sprays elaborados por
laboratórios farmacêuticos e que são utilizados para borrifar nas mucosas.
Especificamente o Brasil tem a
característica de ser um país muito religioso. Até que ponto esta religiosidade
exacerbada influencia em debates – não só no Brasil, mas no mundo – que são
extremamente necessários como a legalização da maconha, aborto, entre outros?
A religiosidade não é patrimônio da sociedade brasileira. Em
maior ou menor medida todas as sociedades tem um percentual de pessoas que
acreditam, outras que duvidam e outras que não acreditam na existência de Deus.
Acho que a batalha aqui é a de chegar ao consenso de que as crenças de uma
parte da sociedade não podem determinar ou influenciar os atos e as decisões
das outras partes. Por exemplo, no caso do aborto, talvez o mais polêmico de
todos: sabemos que são realizados milhares de abortos clandestinos; quem pode
pagar aborta com maior índice de segurança e quem não, arrisca a vida e que
muitas mulheres morrem nessas circunstancias. Ninguém deixa de abortar porque a
lei o proíbe. Caso o aborto seja legal, como já acontece em alguns países, quem
acredita que é pecado não abortará e que decida fazê-lo deve ter condições de
segurança para não pôr a vida em risco.
Pela a sua experiência de
ativista, você crê que atualmente as pessoas estão mais receptivas à informação
quando o tema é a Maconha?
Pela vivência de observar a realidade percebo que muita
coisa está mudando; as crises têm esse lado positivo: trazem muitas re-considerações.
Vários países no mundo já
adotaram uma política de redução de danos e menos repressão quanto à Cannabis.
Para a senhora, existe uma melhor forma a ser seguida para a descriminalização
ou até a legalização da maconha?
Na verdade não creio que exista “redução de danos” no caso
da maconha porque ela não faz dano. Tem alguns casos específicos, como por
exemplo, na esquizofrenia, na bipolaridade, entre outros, onde o consumo de
maconha é totalmente desaconselhado, mas não se trata de redução de danos e sim
profilaxia.
Recentemente você estreou uma
coluna no Blog Maconha da Lata sobre culinária. Conte um pouco mais sobre esta
paixão envolvendo gastronomia e maconha.
Eu não chamaria de “paixão” já que prefiro fumar a Cannabis
do que ingeri - lá.
Há muitos casos nos que fumar é impossível, por exemplo,
motivos de saúde. Recentemente um rapaz conhecido sofreu um acidente horrível e
quebrou duas vértebras lombares o que o deixou sem mobilidade da cintura para
abaixo. Internado em um hospital onde foi submetido a diversas cirurgias
sofrendo dores intensas foi tratado por varias semanas com morfina o que lhe
acarretou todos os efeitos colaterais dos opiáceos. Como cultivador e
consumidor de Cannabis pediu aos médicos que o deixassem fumar, contudo, não
teve sucesso. Entre os amigos preparamos algumas das receitas que estamos
publicando na Maconha da Lata.
Resultado: as dores aliviaram, o humor melhorou e driblamos
a proibição!!
FONTE: http://maconhadalata.blogspot.com
FONTE: http://maconhadalata.blogspot.com
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