Este artigo foi inspirado numa conversa que tive com minha
mulher sobre o livro "Desde que o Samba é Samba", do nosso Amado
carioca Paulo Lins, junto à notícia de tortura sofrida por um jovem maconheiro
e minha dissertação de mestrado "A Acumulação do Poder Punitivo no
Brasil".
A primeira escola de samba, nascida no Estácio, Rio de
Janeiro, foi a "Deixa Falar", que influenciou o surgimento da Estação
Primeira de Mangueira e da Portela. Foi ali, naquele bairro, que desembarcaram
do leste europeu, na época da Primeira Guerra Mundial, fugidas sem seus
maridos, as "polacas" que, junto a outras mulheres pobres, negras e
índias, fizeram do Mangue uma zona de prostituição.
O casamento da prostituição com o samba sempre foi regado à
maconha. Essa potência de vida difundiu-se até localidades distantes do centro,
tal como Madureira, zona norte, que viria a se tornar a capital mundial do
samba, onde estão situadas as quadras do Império Serrano e da Portela.
Mas nem só de alegria viveu o Estácio. Recorda-se que a
polícia militar nasceu em1808 e era formada basicamente de antigos capitães do
mato que eram caçadores de escravos que buscavam liberdade. Embora em 1888 a
escravidão tivesse sido abolida, um ano antes da própria Constituição da
República (1891), foram criados a Seção de Entorpecentes e Mistificação da
Polícia e o Código Penal da República (1890), nos quais eram criminalizados a
vadiagem, a capoeiragem, o candomblé, a maconha, enfim, toda a cultura negra.
Esta seção e este código comprovam que a passagem da Monarquia para a República
não fez mais que acumular o poder punitivo da escravidão com uma nova
tecnologia da prisão celular. A base ideológica das práticas visando controlar
e punir os negros residia no discurso científico lombrosiano que defendia que o
negro era um criminoso nato.
Em recente pesquisa, mais de 50 % dos entrevistados
responderam que são a favor da tortura para determinados crimes. Como se a
tortura fosse resolvê-los. Até hoje, a tortura histórica da escravidão no
Brasil serve para punir almas e corpos dos negros jovens e pobres no Rio de
Janeiro que constituem a grande maioria da população carcerária. Se fossem
acabar com o crime violento, no Brasil, este não mais existiria, pois, aqui,
tortura e pena de morte consistem em práticas institucionalizadas. O Rio de
Janeiro é o lugar onde mais jovens, negros e pobres de 15 a 24 anos morrem em
razão de arma de fogo do mundo. Sobre essas pessoas, a tortura é praticada
livremente nas cadeias e penitenciárias da cidade maravilhosa, num país que
resiste em saber sua verdade.
No último dia 13 de junho deste ano, um jovem de 17 anos
afirmou ter sido torturado pela terceira vez no morro de São Carlos, no
Estácio, porque estava fumando um "baseado". Os policiais da Unidade
de Polícia Pacificadora já teriam chegado perguntando onde estavam os bandidos.
Quando respondeu que não sabia, o jovem, que acabara de fumar maconha, recebeu
uma banda, choque elétrico e submarino - nome dado à prática de colocar um saco
plástico na cabeça da vítima, deixando-a sufocada, desesperada, sem marcas no
corpo.
O caso foi noticiado somente um dia pela mídia e caiu no
esquecimento, da mesma maneira que a Marcha da Maconha, brutalmente dissolvida
por bombas de efeito moral e balas de borracha em Ipanema pela tropa de choque,
mesmo depois de duas decisões favoráveis ao evento pelo Supremo Tribunal
Federal. Trata-se de uma luta histórica e, mesmo com as decisões da Suprema
Corte, vamos encontrar forte preconceito de grande parte da sociedade que acha
que maconheiro deve apanhar, porque É RACISTA A CRIMINALIZAÇÃO DA MACONHA NO
BRASIL.
ANDRÉ BARROS, advogado da Marcha da Maconha
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FONTE: http://maconhadalata.blogspot.com
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2 comments:
André, aonde encontro para ler essa Seção de Entorpecentes e Mistificação de 1890, vc sabe? Sou estudante de Direito e queria dar uma olhada. Muito obrigado, sou um grande fã!
Quem é do Rio e fuma sabe muito bem como é a Polícia no Rio de Janeiro, a mais VIOLENTA E INESCRUPULOSA DO MUNDO. Muitos jovens da classe média também sofrem abusus da polícia carioca, eles acharcam de todas as formas, corrompendo, chantagiando, estorquindo, torturando e uma infinidade de condutas dignas de quem é do lado do mal, e tudo as x só por causa de um baseado, isto é nojento e fede para todos os lados. Eu digo isso porque tive que sair do Rio para morrar com minha mãe em Brasília na época, porque não aguentei ver as injustiças praticadas pela polícia carioca. Pra mim os verdadeiros bandidos são eles, porque se aproveitam da situação para cometer atrocidades.
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